Entrevistas Quadrinhos

Em entrevista ao Tujaviu, Ricardo Manhães fala de sua carreira nas HQs e do encontro de seus personagens com Asterix

Escrito por PH

Untitled-1Já falamos dele por aqui. Ricardo Manhães é um artista brasileiro, natural de Cuiabá, que mora atualmente em Florianópolis. Contrariando todos os prognósticos, depois de morar na França por quatro anos, decidiu orientar sua carreira na direção da Europa. Desde muito cedo, interessado pelos quadrinhos que são produzidos no Velho Continente, acabou se tornando uma figura respeitadíssima no mercado de HQs europeias, onde publica álbuns há 14 anos. Ele, entre outros, é o criador da cultuada personagem Gothic Girl e de A Turma da Tribo. Esta última saga citada foi selecionado no edital de literatura Simãzinho Sonhador, da Secretaria de Estado da Cultura do Amapá (SECULT). É ambientada na Floresta Amazônica, mostrando as aventuras de destemidos indiozinhos, fazendo o possível para salvar sua terra do criminoso desmatamento que vem sendo provocado, há muito tempo, pelo branco invasor. Poti, Apoema, Toró e Baquara terão que ser muito corajosos e inteligentes para interromper a destruição que ameaça seu povo e os animais da região. Para auxiliá-los em sua missão ecológica, contarão com o auxílio de uma mítica figura do folclore nacional. A Turma da Tribo foi realizada com o roteiro do escritor Gian Danton. Em relação ao desenhista da obra, Ricardo tem 42 anos de idade. Cursou Música na UDESC, Secretariado Executivo Bilingue na UFSC e Desenho Industrial. Hoje, é formado em Design Gráfico na UNIVALI. Recentemente, foi elogiadíssimo por Raoul Cauvin, roteirista de Cédric, provando que seu talento está sendo merecidamente reconhecido pelos grandes baluartes da banda desenhada atual. A partir de agora, você poderá conferir a entrevista que Ricardo Manhães deu ao Tujaviu, por e-mail. Agradecemos ao quadrinista pela imensa atenção concedida, já que enviou as repostas, em meio a importantes compromissos internacionais. Ricardo também fez a gentileza de mandar um desenho exclusivo para o site, imagem que publico, após o texto abaixo, juntamente com a capa de A Turma da Tribo e página do sensacional encontro entre seus heróis indígenas e Asterix, paródia que fez, a convite do jornalista Lionel Flips. No final, veja também uma prancha original de quadrinho de Manhães, sem cores, e uma foto do artista.

1 – O que o levou a se interessar pelas HQs europeias?

Morei na França, na cidade de Grenoble, por quatro anos, quando meus pais foram fazer doutorado lá. Ganhei de um álbum do TINTIN, assim que cheguei. Trata-se do álbum “Objectif Lune”. Fiquei encantado com o estilo de desenho e o acabamento da edição, que na França é de capa dura para todas as HQs. Procurei comprar mais quadrinhos por lá para ler no fim de semana e descobri Gaston Lagaffe, personagem humorístico do desenhista André Franquin. Foi paixão à primeira vista.

 
2 – Quais são seus personagens e autores favoritos da banda desenhada franco-belga?

Gosto muito do “Gaston Lagaffe”, do André Franquin (pelo desenho), do “Léonard Le Gênie”, de Turk & DE Groot, HQ totalmente desconhecida no Brasil, e claro, de “Spirou et Fantasio”, porém na versão de dupla Tome e Janry.

 

3 – O quadrinho europeu nunca foi popular no Brasil. O que pensa que deve ser feito para mudar este quadro?

Creio que isto já vem sendo feito por pessoas como você que, através da própria curiosidade ou conhecimento, acabam informando pessoas que nunca tiveram a oportunidade de conhecer o quadrinho europeu mais de perto. Aos poucos, se saberá muito mais sobre HQ franco-belga.

 

4 – Como foi receber, recentemente, um elogio do mito da HQ franco-belga, Raoul Cauvin?

Eu já havia recebido um e-mail da esposa do próprio André Franquin, elogiando meu trabalho, mas isso em 1997, quando ele faleceu. Esse tipo de elogio faz a “criança que desenha” ficar alegre e confiante, pois eram pessoas as quais eu lia com muita freqüência, na minha infância.

 

5 – Como foi o seu encontro com Gian Danton, com o qual realizou A Turma da Tribo?

Foi simples e direto. Ele me mandou um e-mail e mostrou o roteiro da Turma da Tribo, perguntando se eu teria interesse em participar de um edital cultural do estado do Amapá, o Simãozinho Sonhador. Achei muito divertido, principalmente pelo fato de cada índio ter um “poder especial”. Isso veio de encontro com minha vontade de publicar algo exclusivamente relacionado à cultura brasileira. Foi a oportunidade de fazê-lo com carinho. Agradeço ao Gian Danton pelo convite. Fomos felizes nessa parceria, acredito.

 

6 – Qual o motivo que o levou a não publicar A Turma da Tribo, no Brasil, em formato de álbum?

Foi puramente uma questão financeira. A Turma da Tribo foi selecionada no edital cultural Simãozinho Sonhador e o Gian fez o que pôde para encaixar os custos do meu trabalho e a impressão no orçamento. É claro, que merecia uma edição em formato álbum. Penso que em breve, teremos essa oportunidade.

 

7 – Existem planos para editar A Turma da Tribo na França ou na Bélgica? Poderemos esperar por continuações desta saga tão genuinamente brasileira?

Existem sim. Espero ter novidades nesse sentido no início de 2015. E seria uma oportunidade de publicar a continuação, também em português. Só saberei sobre isso no ano que vem.

 

8 – Poderia falar sobre o convite feito pelo jornalista belga Lionel Flips, para que você e Danton participassem de uma homenagem a Asterix?

O jornalista Lionel Flips convidou-me a participar do álbum e da exposição “Concile à Bulles” com uma página ou desenho em homenagem ao Asterix. Eu achei interessante, colocar o Asterix visitando a aldeia da Turma da Tribo, pois ambos moram em “tribos” ou “aldeias” envoltas por floresta.

 

9 – Como surgiu a ideia para fazer esta história?

Foi uma ideia rápida que passei para o Gian Danton, que em meio às suas correrias de aulas, palestras e doutorado, deu uns toques dali e daqui e assim fizemos.

 

10 – Gothic Girl é seu maior sucesso na Europa? Se inspirou em alguma adolescente real para compor o personagem?

O caso da Gothic Girl é um pouco diferente. Não é o meu livro mais vendido, mas é adorada por gente de todo o canto do mundo. Lancei somente um álbum dessa personagem, porém a editora, logo de cara, já lançou uma versão em holandês. Isso fez com que um público diferente tivesse acesso ao álbum. Ainda hoje, recebo pedidos de autógrafos de holandeses, que mandam o álbum de lá para que eu autografe aqui e envie de volta. Para compor a heroína, me inspirei na Charlotte, filha da uma amiga de lá.

 

11 – Conhece o brasileiro Leo, que faz sucesso com Os Mundos de Aldebaran e outros títulos mais? O que acha do trabalho dele?

Conheço o trabalho dele. O Acho muito bom e ele é um grande sucesso na França. Foi o pioneiro dos pioneiros.

 

12 – No Brasil, existe ainda um grande preconceito em relação aos quadrinhos. A grande maioria dos adultos, por achar que se trata de algo exclusivamente feito para crianças, encara HQs com certa estranheza. Acha que isso mudará algum dia?

Em primeiro lugar, a HQ não é nosso maior meio de expressão, assim como não o é o cinema. Nós somos musicais. O Brasil entende, sabe fazer e exportar música. Vejo que nossa população não vai na direção de absorver a HQ como um meio de linguagem e expressão. Isso não é bom nem ruim. Só acho que não faz parte da nossa cultura de massa, de uma maneira mais ampla. Talvez por isso, a HQ fique renegada a um “gueto”.

 

13 – Pelo fato de ser estrangeiro, no mercado europeu de quadrinhos, já sofreu algum tipo de hostilidade, por parte dos autores locais?

Ninguém sabe que sou brasileiro por lá. Como meu trabalho é extremamente específico de um estilo Belga de humor, nunca sou identificado ou visto como estrangeiro. Em 2011, levei uma bandeira do Brasil e coloquei na minha mesa para autografar e “representar” o Brasil.

 

14 – Apesar de ter uma carreira consolidada no Velho Continente, você mora no Brasil. Tem vontade de se mudar de vez para a Europa? Como está o seu francês?

Só voltei, pois meus filhos não queriam mais viver na neve. Eu morava em Metz e nevou muito durante o primeiro mês em que nos instalamos. Todos os meus amigos de infância são de lá. Sinto falta, mas por enquanto, ainda não tomei decisões a esse respeito. Como morei na infância na França, falo fluentemente e escrevo em francês.

 

Tujaviu (1)

 

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Sobre o Autor

PH

É ex-locutor do TOP TV da Record e radialista. Também produz a série Caçador de Coleções e coleciona HQs europeias, nacionais e quadrinhos underground

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